A 540 metros acima do nível do mar, nas encostas do Monte Picca, a aldeia
de Pescosansonesco, na província de Pescara, estende-se em diferentes níveis
até ao contraforte rochoso. Ali, dos jovens cônjuges Domenico Sulprizio,
sapateiro, e Rosa Luciani, fiandeira, nasceu em 13 de Abril de 1817, domingo
“in albis”, uma criança que, baptizada antes do pôr do sol do mesmo dia, se
chamava Núncio.
Órfão e explorado
Em agosto do mesmo ano, o padre Domenico faleceu com apenas 26 anos. Cerca
de dois anos depois, mamãe Rosa se casa novamente, também para conseguir apoio
financeiro, mas o padrasto trata o pequeno Núncio com aspereza e aspereza. Ele
é muito apegado à mãe e à avó materna. Começa a frequentar a escola, uma
espécie de “jardim-de-infância”, inaugurada pelo padre Don De Fabiis, na
localidade de sua nova residência, Corvara.
Para Núncio, estas são as horas mais pacíficas da sua vida: aprende a
conhecer Jesus, o Filho de Deus feito homem que morreu na cruz em expiação pelo
pecado do mundo, começa a rezar, a seguir os exemplos de Jesus e dos santos,
que o bom sacerdote e mestre lhe ensina. Alegre, sociável e aberto, com
amiguinhos. Começa a aprender a ler e a escrever.
Mas em 5 de Março de 1823, sua mãe faleceu: Núncio tinha apenas seis anos e
sua avó materna Rosaria Del Rosso o hospedou em casa, cuidando dele. Ela é
analfabeta, mas tem muita fé e bondade: avó e neto sempre caminham juntos:
juntos na oração, na missa, nos pequenos trabalhos domésticos. A criança
frequenta a escola criada pelo padre Fantacci para as crianças mais pobres e aí
cresce, na sabedoria e na virtude: é um puro de coração que se deleita em
servir a missa, em visitar muitas vezes Jesus Eucarístico no Tabernáculo. Ele
tem dentro de si um horror cada vez maior ao pecado e um desejo cada vez mais
intenso de se assemelhar ao Senhor Jesus.
Quando ele tinha apenas nove anos, em 4 de Abril de 1826, sua avó morreu. Núncio
está agora sozinho no mundo e para ele é o início de uma longa “via dolorosa”
que o configurará cada vez mais a Jesus Crucificado.
Sozinho no mundo, ele é recebido em casa — como aprendiz — por seu tio
Domenico Luciani — conhecido como “Mingo” — que imediatamente o tira da escola
e o “fecha” em sua ferraria, engajando-o nos trabalhos mais difíceis, sem respeito
pela idade e as necessidades mais básicas da vida. Muitas vezes o trata mal,
deixando-o até sem comida, quando lhe parece que não está fazendo o que lhe é
exigido. Ele o envia em missões, independentemente das distâncias, ou dos
materiais a serem transportados, ou dos encontros bons ou ruins que ele possa
ter. Na “bagunça”, no sol, na neve, na chuva, sempre vestido da mesma forma. Ele
não é poupado nem mesmo das surras, “temperadas” com palavrões e blasfémias.
Teria que sucumbir em pouco tempo, mas Núncio já tem muita fé. No recinto
da oficina, batendo na bigorna, ocupado sob o “chicote” dum trabalho desumano,
pensa em seu grande amigo, Jesus Crucificado, e reza e oferece, em união com
ele, “em reparação pelos pecados do mundo, para fazer a vontade de Deus”, “para
ganhar o paraíso”. Aos domingos, mesmo que ninguém o mande, ele vai à missa,
seu único alívio na semana.
Logo ele fica doente. Numa fria manhã de inverno, seu tio Mingo o envia,
com uma carga de ferragens nos ombros, pelas encostas de Rocca Tagliata, em uma
cabana remota. Vento, frio e gelo o exaurem. À noite ele volta exausto, com a
perna inchada, uma febre que o queima, sua cabeça estoura. Ele vai para a cama,
sem dizer nada, mas no dia seguinte não aguenta mais.
O tio dá-lhe como “remédio” o de retomar o trabalho, porque “se não
trabalhar, não come”. Em certos dias, Núncio se vê obrigado a pedir um pedaço
de pão aos vizinhos. Ele responde com sorriso, oração, perdão: «Que seja como
Deus quer. Seja feita a vontade de Deus». Assim que pode, refugia-se para rezar
na igreja, em frente ao Tabernáculo: alegria, energia e luz lhe vem vêm de
Jesus-Hóstia, para que, desde a adolescência, seja capaz de dar muito conselho
sábio aos camponeses que o questionam.
Ele se vê com uma terrível ferida no pé, que logo gangrena. Seu tio lhe
diz: “Se tu não puderes mais levantar o martelo, ficarás parado e puxarás o
fole!” É uma tortura indescritível. A gangrena precisa de limpeza contínua e Núncio
se arrasta até o grande chafariz do povoado para se limpar, mas de lá é logo
perseguido como um cachorro sarnento e por mulheres que, chegando lá para lavar
roupa, temem que isso polua a água. Em seguida, ele encontra um veio de água em
Riparossa, onde pode se sustentar, embelezando o tempo que passou ali com
muitos Rosários à Madona.
Wochinger, um segundo pai
Entre Abril e Junho de 1831, ele é hospitalizado no hospital de L’Aquila,
mas os tratamentos são impotentes. Para Núncio, porém, são semanas de descanso
para si e de caridade para com os outros pacientes, de oração intensa. De volta
a casa, ele é forçado por seu tio a pedir esmolas para sobreviver. Ele comenta:
“É muito pouco o que sofro, enquanto consigo salvar a minha alma amando a
Deus”. Em tantas trevas, apenas o Crucifixo é sua luz.
Finalmente, seu tio paterno, Francesco Sulprizio, soldado de Nápoles,
informado por um homem de Pescosansonesco, traz Núncio para sua casa e o
apresenta ao Coronel Felice Wochinger, conhecido como “o pai dos pobres”, por
sua intensa vida de fé e caridade inesgotável. É o verão de 1832 e Núncio tem
15 anos: Wochinger descobre que está diante de um verdadeiro “anjo” de dor e
amor por Cristo, um pequeno mártir. Uma relação de pai para filho é
estabelecida entre os dois.
Em 20 de Junho de 1832, Núncio entra no Hospital dos Incuráveis, em busca
de tratamento e saúde. O Coronel atende a todas as suas necessidades. Médicos e
enfermos percebem que estão enfrentando outro “S. Luis”. Um bom padre lhe
pergunta: “Tu sofres muito?” Ele responde: “Sim, faço a vontade de Deus.” “O
que você quer?” “Desejo confessar e receber Jesus eucarístico pela primeira
vez!”. “Tu ainda não recebeste a primeira comunhão?” “Não, no nosso país temos
que esperar 15 anos”. “E os teus pais?”. “Morreram”. “E que se ocupa de ti?” “A
Providência de Deus”.
Ele foi imediatamente preparado para a primeira comunhão: para Núncio foi
realmente o melhor dia de sua vida. O seu confessor dirá que «desde aquele dia
a Graça de Deus começou a operar nele de forma extraordinária, para vê-lo
correr de virtude em virtude. Toda a sua pessoa respirava o amor de Deus e de
Jesus Cristo».
Por cerca de dois anos, ele ficou entre o hospital em Nápoles e os
tratamentos termais em Ischia, obtendo algumas melhorias, se bem que passageiras.
Deixa as muletas e ande apenas com uma bengala. Enfim, ele fica mais sereno:
ora muito, deitado na cama, ou indo à capela em frente ao Tabernáculo e ao
Crucifixo e a Nossa Senhora das Dores. Torna-se anjo e apóstolo dos outros
enfermos, ensina catecismo a crianças hospitalizadas, preparando-as para a
primeira confissão-comunhão e para viverem mais intensamente como cristãos,
para valorizar a dor. Quem se aproxima dele sente nele o encanto da santidade. Costuma
recomendar aos enfermos: «Esteja sempre com o Senhor, porque dele vem todo o
bem. Sofre por amor de Deus e com alegria». Por si mesmo, ele ama muito uma
invocação a Nossa Senhora: “Mãe Maria, deixe-me fazer a vontade de Deus”.
Tendo feito todo o possível por sua saúde, a partir de 11 de Abril de 1834,
Núncio passou a residir no apartamento do col. Wochinger, no Maschio Angioino. Seu
segundo “pai” se reflecte em suas virtudes e se preocupa muito com ele,
correspondido por uma profunda gratidão. Pensa em consagrar-se a Deus e,
enquanto espera, o confessor aprova uma regra de vida para os seus dias, regra
semelhante à de um consagrado, que observa com escrúpulos: oração, meditação e
missa matinal, horas de estudo durante o dia, seguido por bons professores, o
Rosário de Nossa Senhora à noite. Ele espalha paz e alegria ao seu redor, e um
perfume fragrante de santidade.
San Gaetano Errico, fundador da Congregação dos Missionários dos Sagrados
Corações de Jesus e Maria, promete-lhe que o acolherá na sua família religiosa
assim que esta começar: “Este é um jovem santo e estou interessado que o
primeiro a entrar na minha congregação seja um santo, não importa se ele está
doente». Muitas vezes, um certo Frei Filippo, da Ordem dos “Alcantarinos”, vem
fazer-lhe companhia e acompanha-o, enquanto estiver em pé, na igreja de Santa
Bárbara, no interior do castelo. Logo, porém, a melhora inicial é acompanhada
pela piora de seu estado físico: afinal é câncer ósseo e não há cura possível. Núncio,
torna-se oferta viva com o Crucifixo, agradável a Deus.
Alegria: do Crucifixo
O coronel é muito próximo dele: desde o primeiro dia, chamou-o de “meu
filho”, sempre retribuído por ele, com o nome de “meu pai”. Agora entende que
infelizmente se aproxima a hora da separação que só a fé consola na certeza do “adeus
no céu”.
Em Março de 1836, a situação de Núncio piorou. A febre está muito alta, o
coração não aguenta mais. Os sofrimentos são muito agudos. Ora e oferece, pela
Igreja, pelos sacerdotes, pela conversão dos pecadores. Quem vem vê-lo recolhe
as suas palavras: «Jesus tanto sofreu por nós e pelos seus méritos a vida
eterna nos espera. Se sofrermos um pouco, gozaremos no céu». «Jesus sofreu
muito por mim. Por que não posso sofrer por Ele?». «Gostaria de morrer para
converter um só pecador».
Em 5 de maio de 1836, Núncio mandou trazer o crucifixo e chamou o
confessor. Ele recebe os sacramentos, como um santo. Ele consola o seu
benfeitor: “Seja feliz, do céu eu sempre o ajudarei”. Ao entardecer, diz ele,
muito feliz: “Nossa Senhora, Nossa Senhora, veja como ela é bonita!” Com apenas
19 anos, ele vai ver Deus para sempre. Um perfume de rosas se espalha. Seu
corpo, desfeito pela doença, torna-se singularmente belo e fresco e permanece
exposto por cinco dias. Seu túmulo é imediatamente um destino de peregrinação.
O Papa Pio IX, em 9 de Julho de 1859, já o declarou “heróicas as suas
virtudes” e, portanto, “venerável”. Em 1º de Dezembro de 1963, antes que todos
os bispos do mundo se reunissem no Concílio Vaticano II, o Papa Paulo VI
inscreveu Núncio Sulprizio entre os “bem-aventurados”. Ao canonizá-lo no
domingo, 14 de Outubro de 2018, o Papa Francisco o confirma como modelo para os
jovens trabalhadores, para todos os jovens, mesmo os de hoje.
Se Núncio, que viveu sozinho na dor, soube dar sentido e beleza à sua
juventude graças a Jesus amou e viveu, porque, com a sua Graça, a Graça do
divino Redentor, do maior Amigo do homem, os jovens do hoje, mesmo ameaçados
pela desordem de todos os sentidos, pelas drogas, pelo desespero, não poderão
fazer da sua vida uma obra-prima de amor e santidade? É preciso acreditar e
obedecer a Cristo crucificado e ressuscitado que faz novas todas as coisas.
Autor: Paolo Risso
Fonte: http://www.santiebeati.it/