domingo, 9 de janeiro de 2011

GREGÓRIO DE NISSA

10 de Janeiro
Padre e Doutor da Igreja
(aprox. 330 - 395)

S. Gregório de Nissa, Padre e Doutor da Igreja

Entre os grandes Capadócios, o metafísico mais subtil, o místico mais profundo e também o mais patético.
Nascido em Cesaréia da Capadócia, é irmão de São Basílio, dois anos mais novo. Sua iniciadora na vida espiritual será sua irmã Macrina, que depois da morte do pai transformou todas as domiciliares de um dos seus domínios, numa espécie de mosteiro doméstico.
Gregório, que só estudou na Capadócia, dominou no entanto a filo antiga, cujos conceitos transformará radicalmente, tanto estóicos como platónicos, no crisol da revelação. Retórico, esposou Teosébia, mulher de grande cultura e grande fé, o que não o impediu de forma alguma, de se tomar bispo de Nissa, em 371, atendendo um pedido constrangedor de Basílio, que se prevenia contra o poder imperial multiplicando na sua metrópole os bispados e entregando-os a homens de sua confiança. No mesmo ano escreveu, a pedido de Macrina, um elogio da virgindade em que desenvolve o tema da castidade interior, unificação de todo o ser à imagem do amor Trinitário. O eros paradisíaco tomava formas que não podemos imaginar. A sexualidade, que simultaneamente o expressa e atraiçoa, foi criada por Deus em virtude da queda: tema que passará, radicalizando-se, para a espiritualidade siríaca (vide Efrém, o Sírio). Teosébia morreu em 385, aproximadamente, "verdadeira santa e verdadeira esposa de sacerdote", dirá um bispo vizinho.
Gregório, especulativo e místico, não consegue se adaptar aos encargos episcopais e suas dificuldades de administrador, já denunciadas por Basílio, permitem aos arianos depô-lo e exilá-lo em 376. Dois anos mais tarde, a morte do imperador Valente, que apoiava o arianismo, toma possível sua volta à cidade onde o povo o recebe com fervor. Após a morte de Basílio, em 379, Gregório se afirma, polémico, contra o racionalismo de Eunómio e o quase monofisismo de Apolinário, participando do triunfo do Concílio de 381. Desempenha papel importante na corte, enquanto o novo imperador, Teodósio, reside em Constantinopla. Quando este parte para Milão (388), Gregório toma distância e se consagra à espiritualidade monástica - Homilias sobre o Cântico dos Cânticos, Vida de Moisés e talvez também o De Instituto Christiano - como se quisesse dar um conteúdo místico às comunidades organizadas por Basílio.
Gregório rompeu e "alegorizou" a conceituação grega para colocá-la a serviço do mistério. Contra Eunómio, para quem a racionalidade esgota o real afirma o carácter ilimitado e portanto incognoscível, da essência divina e o mistério da mais humilde das coisas. Esta essência, no entanto, não é impessoal, ela é amor, e amor "patético" que leva o Deus inacessível a se tomar um "Deus que sofre"; sua "ilimitação" consiste justamente no carácter, que não pode ser objectivado, da Pessoa e da unidade infinita das Pessoas divinas.
O homem é à imagem de Deus e, assim, tão indefinível como ele, além de todo saber e de todo poder que pretenda explicá-lo e condicioná-lo. A Imagem se exprime na liberdade, capacidade dada à pessoa de transcender a natureza no movimento da comunhão. À imagem de um Deus não mónada mas trinitário existe um "homem único" numa multidão de pessoas. Unidade original rompida pela queda e reconstituída em Cristo. Cada um carrega em si a humanidade inteira. O mundo sensível não existindo senão no encontro da consciência divina e das consciências humanas. Diversos graus mais ou menos "milagrosos" de materialidade podem aparecer. Conforme a opacidade ou transparência do homem. Na humanidade de Cristo o mundo se transfigura, e o germe de ressurreição nos é comunicado pelos "mistérios" da Igreja.
A vida espiritual consiste em purificar em si a imagem de Deus para que se torne espelho fiel, segundo uma semelhança-participação. Comporta três etapas: a ética, metamorfose das paixões, cuja correspondência bíblica se encontra no livro dos Provérbios; a física, em que o mundo sensível é rejeitado como ilusão e reabilitado como símbolo e teofania (Eclesiastes); a metafísica, em que a alma se dilata na esfera divina (Cântico dos Cânticos).
O conhecimento de Deus é um desconhecimento no qual a pessoa se lança para além do sensível e do inteligível. É um ritmo de ênstase-êxtase, de luz e de trevas, em que a alma, quanto mais se enche da presença divina, mais tende para o Outro, sempre além. A participação faz crescer o desejo. Deus, quanto mais é conhecido. mais é desconhecido, o homem progride de deslumbramento em deslumbramento, num dinamismo em que a alteridade nunca é separação nem a unidade confusão. O mesmo acontece com o próximo na plenitude do "homem único". Admirável metafísica da comunhão.
Na história do pensamento humano, Gregório aparece como aquele que rompeu os ciclos do pensamento arcaico (ainda presentes no origenismo), reabilitou o devir, deu ao tempo um conteúdo positivo como aprendizado do amor e, sobretudo, como aquele que mostrou que o homem não tem outra definição senão a de ser indefinível, porque é feito por e para o ilimitado de Deus.

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